sábado, 9 de janeiro de 2010

Há um caso de amor entre a Aldeia e o Sol

Viver sem você era absurdo, me faltava ar, me faltava uma porção de coisas essenciais. Eu me perdia em cada pensamento insano, banal e provisório. Pra amenizar o estrago, cai na vida com circo. Entre uma acrobacia e outra tentava esquecer o passado.Ouvia falar dos palhaços, das mágicas e mergulhava naquilo até o pescoço. Eu queria me afogar no que eu não conhecia, pra ver se a tal da aspirina tirava a dor absurda e mal-educada. Então eu pintava a cara. Era meu disfarce e eu o via no espelho todas as manhãs. Era uma espécie de metamorfose, em que a reencarnação se dera no mesmo corpo. Quando me vi feliz sem você, eu já não era apenas uma garota. Metade de mim se tornara mulher, a outra era parte libélula. Às vezes eu me cansava de andar e me lançava sem prumo, como alguém que não tem compromisso com muita coisa. Lá de cima eu olhava o mundo com outros olhos, numa outra vida que eu havia comprado, onde não restava mais espaço para você. E quando chegava a hora de dormir, nem sempre a fantasia largava o meu novo corpo, e então nós lutávamos por horas a fio, e eu me rendia ao cansaço e ao sono, imaginando que no outro dia teria me transformado por completo. E no fundo eu era, era eu.

Agora já não me lembro mais do meu primeiro estado, antes desse inferno astral. Também não me lembro do meu primeiro corpo, que fora me deixando como uma casca, como se eu estivesse trocando de pele, de endereço. Não tenho noção de quantos dias se passaram depois que fugi com o circo. Nem de como vim parar nessa aldeia, ou quanto tempo de vida tem o meu menino mais velho. Eu só sei de uma coisa, aquela falta de ar às vezes me vem com força, culpa da bronquite e daquele mestiço ali, aquele do canto, com um meio sorriso e olhos castanhos. Ele é quem me acorda todos os dias, brinca com os meus sonhos, me acaricia as mãos, ordena coisas às flores, planta jardins no meio do cimento, ordenha vacas, retira os espinhos e compõe lindas cantigas de ninar. Depois que o achei perdido por ai, me encontrei de novo.


quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Quem irá me proteger?


Fui logo jogando o sapato para o lado, abrindo o zíper da jaqueta, desestruturando

o resto dos cachinhos mal arrumados. E então eu me sentei aqui, nessa cadeira que já é um pouco cama, sofá, e apoio para os pés. Sentei-me aqui para colocar as ideias no lugar, já que ultimamente metade delas anda brincando de pique - esconde comigo. Ou será que eu ando brincado de pique – esconde com elas?

De uns tempos pra cá muito coisa anda se escondendo de mim. São os sentimentos, o vento, os amigos. E todo mundo sabe que eu perco o norte muito fácil, que me desloco assim do nada, por coisa alguma. Todo mundo sabe que eu tenho medo de conceitos prontos, de programas repetidos, de pessoas que não mudam nunca. Eu tenho medo de casamento, de solidão aos domingos, do vento que assobia na minha janela. Morro de medo de não terminar mais um calendário, ou de despachar bons ‘partidos’. Tremo na base quando falam de morros uivantes, números ímpares, olhar fugaz, distância, geometria analítica, velhos amores, futuros amantes, beijos repetidos, barulhos da madrugada, declarações inusitadas, animais não domesticados, borboletas assassinas, homem sanguinário, mal entendido, unhas vermelhas, sangue nas paredes e etc.

E depois quando digo: “não me deixe só, eu também tenho medo do escuro”, metade das pessoas não acredita.