sábado, 27 de setembro de 2008

Cortando as cordas

Desligo-me de um mundo que não é o meu,a qual jamais pertenci.Me desfaço das pessoas que o bem não me fizeram e que agora não passam de lembranças estranhas,de marcas.Enfim,permaneço imune a tais cousas,anestesiada e sóbria a ponto de saber com o que estou lidando.E talvez seja essa sobriedade que me faça recorrer aos sentimentos que não sei usar,aqui me declaro vítima e culpada,aqui me reutilizo,me reciclo e me expresso de acordo com a frequência de pensamentos voluntários numa folha de papel.Pensamentos,sentimentos e desejos que ainda não tenho maturidade para administrar então apenas os descrevo e forço-os a se manifestar.
Tenho me comparado muito a um boneco de pano,que não vê,não se mexe e não se move,porém sou dos bonecos insatisfeitos,dos que pulam das prateleiras e portas ou que se escondem de pequenas mãos indesejadas.Sou dos que fogem do que é real e dos que se sentem atraídos por uma música fúnebre,(se é que ainda se fazem bonecos assim)é assim que me sinto,estou em busca de uma verdade ou de um recomeço.Logo recolherei as folhas envelhecidas e os sentimentos brutos e escreverei o que quero utilizando-me como escape,cortarei as cordas e pularei da prateleira para uma nova concepção de mundo deixando de ser mais um boneco.

Bronquite.


Ah!Como eu amo ter falta de ar. É inevitável,intenso,espontâneo,enfim verdadeiro...
Como é bom acordar durante madrugadas a fio e me sentar no sofá,preparar aquelas soluções amáveis e inalar tudo por uma bombinha preenchendo o ócio de todas as noites,me agarrar ao cobertor e tossir até sentir a alma ser escarrada por completo.Tem coisa melhor?Fala sério.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Nostalgia.


Fim de tarde nublada.Sentada numa praia ao lado de uma auto-estrada,eu confesso.Estava perdida nas páginas de um livro cheio de morte.
O céu estava roxo e não se ouvia a melodia dos pássaros alegres,era o que se esperava de uma frívola tarde em que me imaginava no meu leito de morte, orando a Deus e aos anjos,a qualquer um,que me levasse a um lugar que recordo.
Um lugar que não reconheço mais,cuja memória já está vaga e menos precisa do que era antigamente,mas que como essência das poucas coisas que me fizeram bem posso imaginá-las sem escrúpulos,apenas saudade.Permito-me lembrar da chuva que molhava profundamente todas as crianças e velhos que procuravam abrigo debaixo das árvores,do tapete de flores que se formava no chão assim que a tempestade fosse embora e do canto das cigarras que anunciava sua nova chegada.Recordar as coisas que sentia enquanto menina,que podia sentir,dos poucos abraços apertados e do cheiro de bolo de vó que infestava a cozinha após um longo dia.Recordar isso me faz bem,viver a simplicidade das coisas me traz uma felicidade que a algum tempo já não tenho, e talvez por isso esteja perdida ao ler o livro. Indagando-me sobre o fato de que a vida incerta ainda tem muita coisa a me apresentar e que talvez eu seja um conjunto de situações,lembranças e erros mas que acima de tudo sou apenas eu.
Pensando assim,sobre o meu leito de morte,quando irei me deparar com todas as memórias boas e torpes,segui a diante com o livro...
Até que o dia se acabasse e eu sentisse o pesar da vida,
por todas as coisas que fiz,por todas as coisas que amei,
e tudo o que eu tratei injustamente.
Em sonhos,esperando o meu momento de acordar.




"Minha alma tem o peso da luz.Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros..."
Clarice Lispector